LONDRES VIROU SERTÃO
Parecia um desmaio. O corpo estava pesando 100kg no momento em que Yane Marques, de 28 anos, cruzou a linha de chegada no evento combinado – tiro e corrida,no último domingo, no Greenwich Park, margem sul do rio Tâmisa. Única representante brasileira na prova do pentatlo moderno, esta pernambucana – nascida e criada até os 7 anos na cidade de Afogados da Ingazeira (cidade do Sertão do estado, distante 386km da capital) entrou para a história brasileira na modalidade, como a primeira atleta a conquistar uma medalha. Yane se transformou em gigante e ficou com o bronze. O corpo franzino e a estatura mediana mudaram de figura desde o começo da manhã, quando entrou para disputar a primeira prova do dia. Superar obstáculo não causa estranheza a Yane. Sempre batalhou por seus sonhos. Usar o terraço de casa como stand de tiro é normal para ela. Ficar sem treinar é que nunca passa pela sua cabeça. É do tipo destemida mesmo. E evoluir no esporte que abraçou há mais de oito anos era sua missão nos últimos quatro anos.
A 18ª posição na Olimpíada de Pequim foi digerida aos poucos. Ainda lhe perturbava o fato de ter montado um cavalo arisco, em um terreno pesado, cheio de lama. Para a exibição nos Jogos Olímpicos de Londres ela trabalhou dobrado. Dedicação em tempo integral. Afinal, queria desembarcar na capital inglesa no auge da forma. E pelo visto conseguiu. Obteve êxito com a ajuda de poucos, só os mais ‘chegados’. Gastou sola do tênis batendo de porta em porta em busca de um único patrocinador que compartilhasse dos seus sonhos. Acreditasse no seu potencial. Ninguém quis apostar. O crescimento técnico desta brava pentatleta deu um salto quando seu técnico Alexandre França a incluiu em um projeto pioneiro do Comitê Olimpíco Brasileiro (COB). A entidade não desembolsou rios de dinheiros com Yane, mas lhe trouxe independência no treinamento e atrelou novos valores ao sonho olímpico. “A ciência esportiva foi fundamental no crescimento da Yane. Ter saído de um turbilhão e conquistado serenidade para seguir trabalhando fez com que ela amadurecesse. Não chegamos aqui como francos atiradores. Esta evolução dela vem sendo mostrada durante toda a temporada. Ela entrou na pista hoje (ontem) para brigar por medalha”, contou o major Alexandre França, treinador da pernambucana. Mas este investimento poderia não ter dado certo, se do outro lado houvesse o descompromisso, a acomodação e o desleixo com a carreira. Yane Marques, filha caçula de dona Goretti Fonseca, é a responsabilidade em pessoa. Se hoje ela brinda por ser a primeira pernambucana a trazer para casa a medalha olímpica em um esporte individual, é porque lutou e acreditou que chegaria lá. Ao desembarcar na capital inglesa no último dia 7, um repórter de televisão lhe perguntou se ela seria a última a chegar. Ela respondeu: “sou a última da delegação do Brasil a chegar em Londres, mas quero estar entre as primeiras ao final da minha prova”. Ela disse que chegava lá. Esgrima ao som de Aviões do Forró Yane Marque entrou no ginásio Copper Box procurando a sua torcida, em especial a mãe, Goretti Fonseca (sentada na parte superior das cadeiras). Fones no ouvido, deu a impressão que queria relaxar enquanto as adversárias iam sendo apresentadas pelo locutor. Yane enfrentou atletas com jogos variados. Somou vitórias importantes. Deixou escapar resultados que estavam em suas mãos. Nada comprometedor. Somou 21 vitórias, dos 36 jogos disputados. E enquanto aguardava sua hora de jogar, ela sempre recorria aos fones de ouvidos. A trilha sonora? Aviões do Forró! A boa surpresa: Yane aparece na liderança Era a prova que poderia ajudar muito Yane Marques no somatório geral dos pontos ou empurrá-la para a parte de baixo da lista. E como os animais são sorteados 20 minutos antes da prova, hispismo é, sobretudo, loteria. Ontem, quase que o cavalo Over The Odds, de 16 anos, lhe deixava na mão. Yane fez uma montaria nada elegante. Parecia equilibrar-se no dorso do no animal. Ao final, a constatação do bom desempenho dela na pista, apesar de ter saltado com um cavalo apontado como velho: empatada em primeiro lugar com Lara Asadauskaite, da Lituânia. Na piscina, o primeiro sinal de medalha A pernambucana só apareceu na piscina do Aquatic Centre na última bateria (a quinta). Era ali que estavam os melhores tempos dos 200m livre. Na raia 7, saltou para os primeiros 50m misturada entre as seis primeiras. Já para fechar os 100m, ficou um pouco para trás. E nos 100m finais fez uma prova de recuperação. Terminou na 6ª posição, com o tempo de 2min12s07. Yane sentiu o ritmo da disputa. Foi a última a sair da água. Sentou no chão para recuperar o folêgo e seguir para o Greenwich Park, para as provas de hipismo e evento combinado (tiro e corrida). O sprint final para segurar o bronze Yane largou em primeiro, juntamente com Asadauskaite. Cerca de 100m depois, parou diante do estande para os primeiros cinco disparos. Saiu na frente para cumprir os primeiros 1.000m da corrida. Fechou esta primeira etapa em 1º lugar. Fez nova parada no estande de tiro e acertou o alvo cinco vezes. Quando saiu para mais uma etapa da corrida, Asadauskaite já estava no seu calcanhar. Ultrapassou a pernambucana dentro do estádio. Poucos metros dali, a britânica Samantha Murray também passou por Yane. Depois disso, foi na base da superação para fechar os 3.000m. Ana Paula Santos - Diario de Pernambuco |
Nenhum comentário:
Postar um comentário