[Folha de PE 19/05/2014] O industrial dos pirulitos
Empreendedor abriu empresa em nome de terceiro porque ainda tinha 17 anos
Hugo Gonçalves Lima conta que a empresa já passou por dificuldades econômicas por causa da seca
Pirulito. Todo
mundo tem que começar a vida de algum jeito. O sertanejo, que sonhava em
ser industrial e admirava Antônio Ermírio de Moraes, iniciou a vida
“profissional” vendendo pirulitos nas ruas de Sertânia, município do
Sertão de Pernambuco. Disciplinado já aos 14 anos, todo o apurado do dia
era gasto com a matéria-prima para a produção do dia seguinte. Passou
alguns anos nessa rotina até que chegou para os pais dizendo que queria
abandonar os estudos para ganhar o próprio sustento. O rapaz estava
determinado. Terminou o ensino médio e, com a ajuda financeira e a ideia
do pai, montou uma fábrica de doces, em1962, em nome de outra pessoa,
porque aos 17 anos não tinha idade suficiente para abrir um negócio
formal. Começou aproveitando a safra de goiaba da região e vendendo o
doce da fruta em vários formatos. Depois veio a banana, o mamão, a jaca.
Alguns anos de seca, outros de chuva em excesso. Tempos de perdas e de
vitórias. Tudo na vida de Gerson Gonçalves de Lima parecia ser erguido
em cima de extremos.
Saiu de uma
vida humilde para uma de fartura; do anonimato para ser um dos
empresários mais conhecidos da região; da luta de um homem só para mudar
a vida de centenas de pessoas. Mas algo sempre permaneceu estável em
sua vida: a determinação para o trabalho. Em1997, quando a indústria de
Alimentos Tambaú já funcionava em Custódia, cidade vizinha à Sertânia,
uma enchente assustou os moradores, trouxe muita destruição e deixou
todo o maquinário da fábrica debaixo d’água. A empresa ficava às margens
do rio. Quando o proprietário chegou e viu aquele desastre não se
abateu, nem lamento o infortúnio. Homem de fé inabalável, “se pegou como
Deus de Moisés”, como costumava dizer, e começou a construir tudo de
novo. Em vez de entregar os pontos, a coragem de Gerson cresceu coma
ocasião. Costumava falar que depois de se reerguer, tudo parecia chegar
mais facilmente.
Quando as águas
baixaram, a fábrica mudou de endereço. Foi para o prédio onde
funcionava o hotel que pertencia à família, que mudou de lugar por causa
das obras da BR-232. O hotel passou a operar às margens da rodovia para
atrair os visitantes. A Tambaú ocupa o antigo local até hoje. É um dos
pontos de referência da cidade. A empresa foi crescendo e comprando as
casas vizinhas. Boa parte da vida do município gira em torno da fábrica,
que emprega 400 pessoas e produz 93 itens.
Banana e outras frutas são principais matérias-primas
Gerson sempre
viveu para a empresa. Diariamente se antecipava ao sol, colocava a roupa
e ia para a fábrica. Gostava de ver o movimento começando, os
trabalhadores chegando, as máquinas girando. Sete e meia da manhã,
voltava para casa para tomar café. Comia e corria novamente para o
negócio. Ficava por lá o dia inteiro. A noite, a diversão era jogar
gamão e damas com os amigos, mas tinha poucos momentos de lazer. Seu
vício era o trabalho. Em um Carnaval, a direção da empresa resolveu
parar por quatro dias e dar folga aos funcionários, mas o dono não tirou
o olho do gado. A sua folia era no escritório. Mesmo coma insistência
da família, não quis viajar para aproveitar a folga.
Uma herança que atravessa gerações
Hugo Lima, que
toca a empresa juntos com irmãos, gosta de falar do pai. Parece até um
menino grande quando recorda as peripécias do velho. Relata tudo com
orgulho e diversão. Foi criado dentro da fábrica. Conta que, assim como
acontece com todo negócio, a fábrica passou por dificuldades enormes com
os diversos planos econômicos que, volta e meia, sacudiam a vida
financeira dos brasileiros. “Lembro da inflação de 90% na época do
Governo de Sarney. A gente ficava louco, mas meu pai não se abalava.
Acreditava muito no que fazia”, relembra. Em 1993, o negócio viveu um
momento difícil. A seca assolou a região e acabou com a safra de goiaba.
Não se via uma fruta nas árvores. Para não demitir os funcionários,
Gerson deu folga coletivas remuneradas a boa parte deles e, dois meses
depois, quando os tomates começaram a brotar, chamou todos de volta para
começar a produzir a linha de atomatados que hoje responde por boa
parte da produção da Tambaú.
“Era um líder
nato. Muito Respeitado pelos funcionários e até pelos concorrentes”,
garante Hugo. Além do trabalho árduo, uma qualidade que Gerson
respeitava era o empreendedorismo. Ele trazia essa característica na
alma e sentia prazer em ver isso nos seus empregados. Quando alguém
batia na porta do seu escritório para dizê-lo que iria sair da empresa
para montar o próprio negócio, o dono não só dava conselhos sobre gestão
como ajudava os novos patrões financeiramente. O mesmo tratamento era
dado aos concorrentes. Quem quisesse visitar a fábrica para aprender
sobre o setor era recebido de portas abertas.
Nos anos 1980, o
sonho de muitos funcionários era ter uma bicicleta. Esse também era um
desejo de consumo de Gerson quando jovem. Ela alugava a magrela para
impressionar as namoradas. Mas não tinha dinheiro suficiente para
comprar uma. “Como ele não conseguiu realizar esse sonhou, trazia de São
Paulo as bicicletas para os empregados da fábrica e pagava metade do
valor do produto. Era um orgulho grande para ele poder proporcionar esse
prazer aos funcionários”. O filho conviveu com o pai na empresa durante
10 anos. Em 2000, Gerson faleceu com 63 anos, dois anos depois de ter
perdido a filha caçula para o câncer. Mas sua marca está em todos os
cantos da fábrica. Das fotografias do escritório ao modelo de gestão
adotado. “Aprendi muito com meu pai. Não sou como gerir uma empresa, mas
também como ser uma pessoa de caráter”.
Produção - Hoje
a Tambaú produz três mil toneladas de alimentos por mês e atende todo o
mercado Nordestino e parte do Norte. O próximo passo, que deve ser
executado nos próximos cinco anos, é abrir uma unidade em Goiás.
Fonte Folha de PE
Fonte Folha de PE
Nenhum comentário:
Postar um comentário