DITADURA - Os últimos atos de Miguel Arraes antes da deposição Ex-governador rejeitou propostas de adesão ao regime ou renúncia ao mandato após o golpe militar
Miguel Arraes cercado por militares no Palácio do Campo das Princesas no dia do golpe de 1964. Foto: Arquivo/DP/D.A Press
Por Andrea Pinheiro e Tercio Amaral
Há exatos 50 anos, o então governador de Pernambuco Miguel Arraes (PSB), já falecido, era destituído do comando do governo do estado em virtude do golpe de estado de 1964. Apesar da tentativa do almirante Dias Fernandes, comandante do 3º Distrito Naval, que no dia 31 de março afirmou ao socialista que os militares baseados no estado resistiriam à ação militar, o governador foi destituído do cargo um dia depois. O Palácio do Campo das Princesas chegou ficar sob a mira de canhões estacionados no Cais do Apolo, no Recife Antigo, e na Rua da Aurora, no Centro.
No dia 31 de março, Arraes conversou com o presidente João Goulart, que relatou as dificuldades encontradas pelo governo federal, além da situação política em Minas Gerais. No mesmo dia, o governador que seria deposto enviou uma nota oficial aos jornais do estado garantido que a situação no estado estava "tranquila". Arraes, no texto, também defendia a democracia e a legalidade. O discurso, porém, não estava de acordo com a realidade. O golpe já era quase um fato consumado.
No mesmo dia, Arraes se reuniu com assessores no Palácio do Campo das Princesas, onde também residia com a mulher e os filhos. Dois dirigentes do PCB, David Capistrano e José Leite, que estavam na reunião, sugeriram que o governador fosse para o município de Palmares, na Mata Sul, onde teria condições de resistir. O governador recusou a proposta, o que, mais tarde, seria analisado como uma postura bem pensada, já que tropas do Exército, vindas do estado vizinho de Alagoas ocupavam a cidade pernambucana.
Miguel Arraes também escreveu e enviou um manifesto aos demais governadores da região Nordeste. No documento, ele pedia que todos resistissem à quebra de legalidade e que apoiassem o presidente deposto João Goulart. O apelo não encontrou ressonância. Na noite do dia 31 de março, como o golpe de estado era um fato eminente, Miguel Arraes decidiu não dormir no palácio.
RESISTÊNCIA ATÉ O ÚLTIMO MINUTO DE LIBERDADE
Miguel Arraes sendo levado ao 14º Regimento de Infantaria, em Jaboatão dos Guararapes. Ele deixa o Palácio do Campo das Princesas em companhia do assessor e primo Valdir Ximenes e de um oficial do Exército. Foto: Arquivo/DP/D.A Press
Miguel Arraes iniciou o dia 1º de abril em conversas com assessores e sua mulher, a então primeira-dama Magdalena Arraes, que tentou manter a rotina dos filhos, inclusive, indo normalmente à escola. Os tanques do Exército já apontavam para o Palácio do Campo das Princesas. A primeira-dama começou a arrumar as malas das crianças para que elas fossem passar alguns dias na casa de uma das avós. Os filhos do casal foram orientados a não voltar ao palácio depois da aula.
"Chegou um coronel no palácio e disse que Arraes seria preso e ele disse: o senhor não tem autoridade para me depor sou escolhido pelo povo", disse o advogado Ivan Rodrigues, ex-assessor de Miguel Arraes, acrescentando que o coronel prometeu garantias, mas Arraes retrucou. "Ele respondeu: não preciso de suas garantias, sou o governador de Pernambuco e assumirei o governo de Pernambuco esteja eu onde estiver (...)". Ivan foi uma das testemunhas do encontro e disse que Arraes fechou a porta do palácio e deixou o coronel a ver navios.
Uma passeata foi organizada no Recife por estudantes em defesa da legalidade, mas o movimento foi sufocado pelo Exército. Os estudantes Ivan Rocha e Jonas Albuquerque foram atingidos à bala e morreram. Três pessoas ficaram feridas. O comandante do IV Exército, Justino Alves Bastos, telefonou para Arraes, que reclamou do cerco ao palácio. O comandante, no entanto, manteve as tropas nas ruas.
No final da manhã, dona Madalena deixou o palácio para encontrar os filhos. À tarde, o governador recebeu o então prefeito do Recife, Pelópidas Silveira, e Celso Furtado, presidente da Sudene, no palácio. Após a chegada deles, o Almirante Dias Fernandes foi ao palácio comunicar a deflagração do golpe. O prefeito do Recife, que também seria deposto, tenta deixar o palácio, mas é impedido. Dona Magdalena tenta entrar, mas não é autorizada.
Os coronéis João Dutra Castilho, do 14 º Regimento de Infantaria, e Ivan Rui de Andrade Oliveira, do 7º Regimento de Obuses, chegaram ao palácio para comunicar que Jango havia sido deposto, que as Forças Armadas haviam assumido o comando do país, e que Arraes deveria renunciar. À noite, os militares voltam ao palácio para prender Arraes. O local já havia sido esvaziado, só restavam Arraes, o tio Antônio Arraes de Alencar e Valdir Ximenes, diretor da Companhia de Revenda e Colonização, casado com uma prima de Arraes.
A MENSAGEM AOS PERNAMBUCANOS NUNCA VEICULADA
Antes da ordem de prisão levada pelo coronel Dutra de Castilho, o governador Miguel Arraes gravou uma mensagem aos pernambucanos, que deveria ser distribuídas em rádios do estado. A gravação foi realizada pelo jornalista Eurico Andrade, do jornal Última Hora, que tinha uma versão no Recife. A mensagem não pôde ser compartilha porque as rádios já estavam ocupadas pelos militares.
"Sei que cumpri até agora o meu dever para com o povo pernambucano, sei que estou fiel aos princípios democráticos e à legalidade e à Constituição que jurei cumprir. Deixo de renunciar ou de abandonar o mandato, porque ele está com minha pessoa e me acompanhará enquanto durar o prazo que o povo me concedeu e enquanto me for permitido viver", disse o governador deposto.
Miguel Arraes deixou o palácio e foi detido no 14º Regimento de Infantaria, em Socorro, em Jaboatão dos Guararapes. Arraes deixou o palácio em um fusca dirigido por Ximenes. Nesse mesmo dia, a Assembleia Legislativa realizou uma sessão extraordinária, acompanhada por militares dentro do plenário. Por 45 votos contra 16 e um em branco considerou a vacância do cargo de governador.
A Câmara de Vereadores do Recife, que estava em sessão permanente desde a noite anterior, cassou o mandato de Pelópidas Silveira. Na manhã do dia 2 de abril, num comunicado veiculado nas rádios, os militares anunciaram que Arraes havia sido transferido para o arquipélago de Fernando de Noronha. O então vice-governador Paulo Guerra (Arena) é empossado governador de Pernambuco.
O ex-governador Miguel Arraes concedeu entrevista à Agência Brasil em 2004, quando o golpe militar completava 40 anos. Na oportunidade, então deputado federal, que veio a falecer um ano depois, contou com detalhes como foi que os militares assumiram o poder e, em 1964. Sem aceitar renunciar ao mandato, ele viu o Palácio das Princesas, no Recife, ser cercado pelos militares no dia 1º de abril e, no fim da tarde, foi deposto do cargo. Do lado de fora do palácio, canhões eram apontados para o prédio. Arraes foi exilado na Argélia e só retornou ao Brasil em 1979, com a lei da anistia.
Confira abaixo tópicos da entrevista dele à Agência Brasil, concedida em 4 de março de 2004:
Prisão relâmpago
"Eu estava em Pernambuco, era governador e fui preso no Palácio do Governo, que estava cercado. Prenderam-me no exercício do cargo de governador e não pude fazer nada. Não restava outra coisa a fazer, as resistências já tinham caído no país todo. Fui preso na tarde de 1° de abril, esperando que houvesse alguma manifestação de reação, que não aconteceu".
Sem surpresas
"Eu sabia que o golpe iria acontecer porque estive no comício de 13 de março de 64 na Central do Brasil, no Rio de Janeiro. De lá fui para Juiz de Fora participar de uma concentração, e quase não consigo discursar, porque existiam 200 homens civis armados nas ruas. Eles eram comandados por um cidadão chamado Adão Rafael, que, acho, era deputado, sustentado pelo general Olympio Mourão. Depois fui para Belo Horizonte, conversei com Magalhães Pinto, que era governador de Minas, e segui para Brasília. No dia 17 ou 18 de março conversei com Jango e disse a ele que o golpe estava na rua. Então não fiquei surpreso".
Organizar a reação
"Retornei a Pernambuco disposto a me organizar para a reação contra o Golpe. Isso se fosse possível, se fosse o caso. Não consegui dar inicio, porque não havia mais ninguém resistindo. Ninguém resistiu e seria um suicídio e um banho de sangue em Pernambuco. Seria uma decisão isolada, solitária. Fiquei esperando essa reação até a madrugada do dia 1° de abril. Amanheci cercado pelo Exército e tive que tomar posições para evitar, que alguns loucos partissem para uma reação contra o golpe, que eles pudessem agir isoladamente, emocionalmente, o que não era aconselhável. E aguardei passivo para ser preso, para o que o destino me reservaria naquela situação".
Golpe permanente
"O golpe sempre existiu e foi mais ou menos permanente desde que Getulio Vargas reassumiu o poder. É preciso recordar que, quando ele se elegeu, em 50, em uma grande campanha - e aqui quero ressaltar que não sou getulista, nunca fui do PTB e sou uma pessoa que sempre lutou com uma certa independência no campo político -, essa história começou. A conspiração data da hora em que Getúlio se elegeu. Ele tomou posse porque as forças nacionalistas de esquerda dentro do Exército foram vitoriosas. Quando o general Newton Estilac (ministro da Guerra de Getúlio) se elegeu presidente do Clube Militar, ficou claro que a maioria da oficialidade defendia a posse de Getúlio".
Revolta com a repressão
"Quem luta politicamente não tem direito de ter mágoa, nem alegria, só pode pensar naquilo que deve fazer. Tenho revolta pelos excessos cometidos pela repressão do regime militar sobre outros companheiros, alguns que morreram, outros sofreram torturas, prisão, discriminação, perseguição. Enfim, acho que nós devemos sempre comentar para que isso também não volte a se repetir no Brasil".
Clandestinidade
"Fiquei pouco mais de um ano na prisão e fui libertado por um hábeas corpus do Supremo Tribunal Federal. Depois fui novamente preso e libertado pelos militares. Fui libertado no Rio de Janeiro. Era preso, me soltavam, era chamado para depor, nem incomodava mais meu advogado, que era o doutor Sobral Pinto. Ele tinha ilusões com a abertura, e eu não tinha ilusão nenhuma, mas não podia sair sem ele, sem que ele concordasse. Em determinada altura lhe disse que não dava mais: entrei na clandestinidade por um mês, mais ou menos, enquanto tentava conseguir uma embaixada. A que consegui foi a da Argélia, país onde fiquei exilado durante 14 anos".
Compromisso com a história
"Passei isso tudo, mas quero registrar que não tenho queixas a fazer, e que nem sou uma pessoa que tinha feito algo de extraordinário. Fiz menos que muitas pessoas nesse país. Fiz o que me competia e tinha que fazer".
Em defesa de Jango
"Veja, sou do Nordeste, sempre tinha feito política no Nordeste. Tinha sido deputado estadual duas vezes, fui prefeito do Recife e depois governador. Tinha muito poucos contatos políticos. Conhecia o Jango, conhecia outras pessoas aqui do Sul, mas não tinha uma relação pessoal, de convivência com as pessoas daqui. Mas me dei muito bem com Jango. Acho que ele é muito injustiçado. Ele era um homem que era o que era. Ele nunca disse que era estadista, nunca disse que iria fazer e acontecer neste país. Ele ficava naquilo que era e podia fazer. Era um homem paciente. Sabia ouvir. Dentro disso, acho que cumpriu um papel importante para o país. Naquela oportunidade, Jango, politicamente, tinha muito boas relações públicas. Isso se via perfeitamente".
Influência americana
"Todo mundo sabe que os americanos estavam presentes no Brasil. Eu era governador e tinha em Pernambuco um cônsul americano e 15 vice-cônsules, coisa que nunca aconteceu neste país. Além de assessores por todos os lados. Chegou ao ponto que mandaram para lá, no governo de John Kennedy, um embaixador extraordinário para ver a situação do estado. Aqui eles estavam presentes mais do que em outros lugares da América do Sul. Todo mundo sabe que os americanos tinham despachado uma força-tarefa para cá. Mas acho que o golpe não tinha inteiramente razões para existir, porque o próprio Jango preparou a sucessão dele com muita antecedência. Foram lançados dois candidatos para a Presidência da República, que eram Juscelino Kubitschek e Carlos Lacerda. Políticos confiáveis, digamos assim. Representantes da esquerda e de outros setores da sociedade queriam outras saídas do ponto de vista político, mas agiram sozinhos, isoladamente, porque também queriam mudar o país".
Comunismo não. Idéias justas
"Pernambuco não tinha nada de mais. Havia uma mobilização popular muito forte, o que é natural, e estávamos promovendo o Acordo do Campo, que nós fizemos. Queríamos romper, pelo menos, com aquilo que era socialmente insuportável. Os trabalhadores da cana ganhavam um terço do salário mínimo. Não dava para concordar com uma coisa daquelas. Tinham que ganhar pelo menos um salário mínimo, que era o que eles mereciam. Isso não tem nada de comunismo, de socialismo. Tratava-se de justiça concreta".
Semelhança com o Vietnã
"Internamente, não havia nenhuma motivação para o Golpe. Acho que há certas interpretações sobre o Golpe Militar no Brasil: uma delas é de que havia um movimento de massa muito forte no mundo inteiro. Esse movimento de massa, reivindicatório, era muito avançado no Vietnã, onde já tinham as forças de Ho Chi Min se instalando. As forças americanas pretendiam desalojá-los de lá. Esse movimento geral de massa fez com que isso aqui tenha parecido um golpe preventivo, para não se abrir uma outra frente em outro continente, e num país da dimensão do nosso. Então, esse golpe preventivo foi dado poucos meses antes do avanço americano dentro do Vietnã. Eles só se lançaram efetivamente lá, quando o golpe se consolidou aqui. Não posso afirmar que uma coisa esteja ligada a outra, mas os fatos são esses. Há quem interprete dessa forma".
Militarização do mundo
"Vê-se que a partir do golpe no Brasil houve o da Indonésia, em 65, onde morreram 500 mil pessoas fuziladas. Sucederam-se depois os golpes no Extremo Oriente e na América Latina, a ponto de, a certa altura, a América Latina estar coberta por regimes militares, um dos quais o de Pinochet, no Chile. Outro na Argentina. Este, um golpe extremamente violento. A militarização do mundo se deu então naquela hora. Esse panorama só começou a se alterar perto dos anos 70, quando o Vietnã, os vietnamitas começaram a avançar na sua luta, a levar vantagens contra a brutal maquina de guerra que invadiu o território deles. As outras reações que apareciam em várias partes isoladamente, porque havia uma insatisfação generalizada. Houve então a decisão de desmilitarizar. Essa desmilitarização foi apontada num relatório feito por Nelson Rockfeller (prefeito de Nova Iorque), que andou por aqui a certa altura com 200 assessores, dois aviões. Esse relatório não foi muito difundido aqui. A imprensa noticiou apenas os fatos que podia publicar".
Metralhadora e televisão
"O mal trazido ao Brasil pela ditadura foi a falta de informação da população, a manipulação do ensino, aquilo que foi jogado na cabeça das pessoas. Além disso, o silêncio sobre as lutas do povo, que não eram ensinadas aos jovens. A geração que nasceu por volta do ano de 64 não entende a formação de quem se formou antes, daqueles que desde muito cedo foram ensinados conhecendo os problemas brasileiros, os problemas da nossa população. Acho que esse é o prejuízo principal, e acho que a arma principal que está sendo utilizada - disse isso há muito tempo - para substituir as metralhadoras dos militares é a câmera da televisão".
Ligas camponesas
"As Ligas Camponesas eram um movimento paralelo à sindicalização e à união que havia entre os trabalhadores rurais. Eles tinham começado esse movimento entre pequenos proprietários, foreiros, arrendatários de terra. Agora esse movimento comandado por Francisco Julião era mais visível do ponto de vista geral, inclusive porque ele era uma pessoa que tinha uma certa capacidade de transitar em muitos lugares, e fazer dessa bandeira - que é uma bandeira que todos nós concordávamos - conhecida nacionalmente. Mas, do ponto de vista do volume de gente engajada nas Ligas, não era muito expressivo. Não era não. Pegue a votação de Julião (eleito deputado federal). Ele não tinha muita votação, principalmente junto à classe média. Era uma pessoa considerada por todos nós. Fui seu colega na Assembléia Legislativa e atuei ao seu lado depois, nas questões rurais. Também dávamos apoio ao trabalho dele. Não o deixamos para trás".
Em nome dos trabalhadores
"O Acordo do Campo, o primeiro feito no país, entre donos de terra e trabalhadores, deu bastante trabalho, mas os próprios proprietários constataram que essa era a saída que tinha que haver, porque eu disse que os trabalhadores tinham conquistado o direito de sindicalização naquela época. Os sindicatos rurais estavam organizados, quando assumi o governo de Pernambuco. Foi aí que começaram essas negociações. O pessoal da cana-de-açúcar se organizou unificadamente, havia uma unidade muito grande entre eles, portanto era uma força poderosa, disposta a negociar. Então, era apenas uma questão de ajuste, porque estavam vendo que, se não negociassem, seria um desastre, porque ninguém ia botar a polícia para segurar 100 mil trabalhadores. Foi diante disso que eles (usineiros, produtores e revendedores de cana) negociaram. Fui mediador de tudo isso e esse acordo nem a ditadura conseguiu destruir. Ele ficou. Como era uma coisa autêntica, que vinha de uma realidade dura, concreta, eles não puderam mexer. Eles foram procurando cortar as beiradas do acordo, reduzir as vantagens, mas ele é referência até hoje na questão da cana-de-açúcar".
Energia
"O povo nordestino ainda carece de coisas mínimas, e nós estamos nos atrasando, distanciando muito do resto do país pela ausência de infra-estrutura, de condições de crescimento. Em 1963, eu estava no governo de Pernambuco, Celso Furtado era presidente da Sudene (Superintêndencia de Desenvolvimento do Nordeste) e lhe falei sobre a necessidade de aumentar a oferta de eletricidade no Estado com a chegada da rede da Chesf (Companhia Hidroelétrica do Vale do Rio São Francisco), que estava sendo inaugurada com atraso de meio século em relação ao futuro. Queria que a Chesf levasse energia aos povoados, às populações rurais. Foi enviado um projeto para o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Foi o Celso que o viabilizou. E veio o golpe, e esse projeto foi aprovado e executado pelos governos militares de forma totalmente diferente daquela que tinha sido prevista. O que se pretendia era democratizar a energia. O que eles fizeram: colocaram energia nas grandes propriedades, e a rede elétrica passava por cima dos pequenos. Então, eram 29 mil propriedades grandes - a menor tinha 200 hectares. Minifúndios e pequenas propriedades não foram atendidos.
Quando volto ao governo, retomo aquele projeto de 1963. Ora, de 63 para 86 já fazia um bocado de tempo. Então havia uma preferência dos governos militares pelos grandes proprietários e não pela população. Devia haver preocupação com todo mundo, com os grandes, com os pequenos e com os médios. E nesses dois governos que fiz depois de voltar, eletrifiquei cerca de 80% das propriedades. Em qualquer lugar tinha energia. Coisas desse tipo são elementares. A população quando vota não está querendo saber se o candidato é do PFL ou de um partido de esquerda. Quer é infra-estrutura para viver com dignidade. É que sempre procurei demonstrar que se faz muito pouco, muito pouco mesmo em coisas que o povo já deveria ter desde o começo do século passado. Só sobrevivi politicamente no nordeste por ser defensor dessas causas".
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