Sarney sai da cena política sem deixar herdeiros de grande expressão nacional
Senador desistiu da reeleição e vai encerrar carreira política
José Sarney anunciou a aposentadoriaEstadão Conteúdo |
A aposentadoria do senador José Sarney (PMDB-AP) pegou boa parte dos eleitores e da classe política de surpresa, apesar de o cacique do PMDB ter dito, no ano passado, que não se candidataria à reeleição.
Depois de 60 anos na vida pública, a saúde frágil da esposa, Dona Marly, e os próprios problemas, que o levaram algumas vezes ao hospital, foram os motivos alegados da saída — embora, nos bastidores, fale-se que Sarney temia não ser reeleito.
Para a doutora em ciência política da Unesp (Universidade Estadual Paulista) Maria Teresa Miscelli Kerbauy, Sarney não deve deixar herdeiros com grande expressão nacional, embora seus filhos estejam envolvidos na política.
— Acho que nem a filha [Roseana Sarney] nem o filho [Sarney Filho] teriam condições de dar continuidade – diz– Pode até ser que, de uma perspectiva regional, sim. Mas, nacionalmente, nenhum teve a projeção que Sarney teve.
Roseana Sarney, filha do senador, já foi deputada federal, senadora e governadora do Maranhão, cargo que ocupa atualmente. Sarney Filho é deputado federal do Partido Verde (PV) pelo Maranhão.
O cientista político da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Marco Antônio Teixeira concorda que é difícil que os filhos ocupem o espaço do pai.
— Não dá para você falar de sucessor natural.
Mas Teixeira acredita que a forma de se fazer política como Sarney continua.
— Por mais que as pessoas saiam da política, o modus operandi continua o mesmo. Acho que essa [renovação] é uma construção da sociedade.
Maria Teresa afirma que Sarney representa um jeito antigo de se fazer política.
— É uma prática política tradicional, de clientelismo, de troca de favores. A gente gostaria que essa prática se extinguisse no Brasil, que as práticas políticas fossem caracterizadas por critérios democráticos. Acho que isso [aposentadoria] pode significar uma renovação dessas práticas.
Carreira
Sarney se envolveu na política assim que entrou para a Faculdade de Direito e passou a coordenar o comitê eleitoral de um amigo que se candidatou a deputado no Maranhão.
Em 1954 se filiou ao antigo PSD (Partido Social Democrático) e foi eleito suplente de deputado federal. Assumiu pela primeira vez uma vaga na Câmara em 1955.
Em 1965, um ano depois do golpe militar, aos 35 anos de idade, José Sarney conquistou o Palácio dos Leões e se torna governador do Maranhão com mais de 60% dos votos válidos. Desde então já foi senador e presidente da República.
O cientista político da FGV destaca que Sarney esteve em todos os governos desde o regime militar e “tem uma trajetória política muito forte no País”.
— Não há como negar a presença política dele. Foi presidente, participou do governo FHC. No governo Lula, em momentos de crise, teve o papel de sustentação política.
Para Maria Teresa, poucos nomes conseguiram se manter na política após a transição entre os períodos ditatorial e democrático como Sarney.
— Poucas lideranças fizeram a sua trajetória durante a ditadura militar e conseguiram continuar. Isso tem um significado. Ele foi uma liderança expressiva do Maranhão e da forma como ele controlou a política maranhense ele chegou ao resto do País.
Para Teixeira, Sarney, como líder, vai ser lembrado também por coisas que não fez.
— Ele poderia ter liderado a reforma política, por exemplo, como alguém de liderança forte. Ele tem uma parcela de culpa por atitudes que não tomou.
O anúncio da aposentadoria deve ser formalizado em convenção regional do PMDB, no Amapá, na próxima sexta-feira (27).
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