Machismo histórico » Mulheres sem peso na política pernambucana
Pernambuco é um dos quatro estados do país que nunca empossaram uma prefeita, governadora ou senadora
Aline Moura - Diario de Pernambuco
Política em Pernambuco também se escreve com “h”, de homem. A proximidade das eleições estaduais e a lista apresentada pelos partidos para a disputa de um espaço na Câmara dos Deputados ou na Assembleia Legislativa revela um cenário político desigual e dominado pelo sexo masculino. A mulher que “corre com lobos”, segundo as lendas, e compõe mais da metade da população do estado, segundo o IBGE, está longe de ser protagonista nos espaços de poder. Dos 26 estados da federação brasileira, além do Distrito Federal, Pernambuco está entre os quatro do país que nunca tiveram uma mulher à frente do governo do estado, no Senado ou na Prefeitura do Recife.
Em um levantamento feito pelo Diario, foi possível perceber uma estagnação na desenvoltura da mulher na política estadual desde a redemocratização. Do Nordeste, Pernambuco, Paraíba e Piauí nunca empossaram alguém para chamar de governadora ou senadora. Em situação semelhante, só existe um estado no Norte do país, o Amapá, reduto eleitoral de José Sarney (PMDB). Maranhão, Ceará, Alagoas, Rio Grande do Norte, Sergipe e Bahia ultrapassaram o estado pernambucano, que se considerava vanguarda. Todos revelaram lideranças femininas que ora saíram de famílias com cacique político, ora vieram dos movimentos sociais, como Roseana Sarney (PMDB) e Heloísa Helena (PSOL), respectivamente.
A escritora Raquel de Queiroz, uma apaixonada pela política, já dizia que “ser heroína era muita mão de obra”. Em Pernambuco, ao que parece, esse papel de decisão e poder continua assustando. E não há muita perspectiva de mudança nas eleições desde ano. A chapa majoritária dos dois principais concorrentes ao governo, Paulo Câmara (PSB) e Armando Monteiro Neto (PTB), é composta apenas por homens. As mulheres não tiveram força e voto para emplacar um nome.
As coligações comandadas por Paulo e Armando para concorrer ao mandato de deputado federal, por exemplo, também não atingiram a cota de 30% exigida pela minirreforma eleitoral de 2009. O maior chapão de Paulo Câmara tem inscritos 36 homens (72%) e 14 mulheres (28%). O de Armando Monteiro possui 31 representantes do sexo masculino (73,81%) e 11 do sexo oposto (26,19%).
Em 1553, na época que o Brasil ainda era colônia, uma mulher tornou-se pioneira em Pernambuco ao ganhar o título de “capitoa”, assumindo o comando da Capitania que seu marido, o donatário Duarte Coelho, havia recebido como doação de D. João III. Segundo dados da Assembleia Legislativa, Brites de Albuquerque ou Dona Beatrix ficou no comando da Capitania até a maior idade do seu filho, em 1560, e não foi a única a dar orgulho à classe feminina desde aquela época. Hoje, contudo, há certa dormência no universo do batom, reforçada pelo descumprimento da legislação.
O Ministério Público Eleitoral pode analisar o Demonstrativo de Regularidade de Atos dos Partidos (Drap) e sugerir a impugnação de todas as coligações e partidos que não apresentarem a quantidade de mulheres necessárias para a disputa. Mas a medida ainda passa pelo Tribunal Regional Eleitoral e cabe recurso no TSE. É considerada pelos que entendem da área muito subjetiva. Por isso o alto grau de descumprimento. Até o sábado retrasado, 13.642 candidatos se registraram para disputar as eleições, e apenas 3.955 destes eram mulheres.
Sem pesquisa para identificar os porquês
Não existem estudos aprofundados sobre os motivos que levaram ao enfraquecimento das mulheres na política, especialmente num estado que já revelou nomes como Anita Moraes - “uma mulher contra o império da peixeira ”, como dizia a jornalista Lêda Rivas -, e Cristina Tavares, a terceira nordestina a conseguir uma vaga na Câmara dos deputados.
Segundo o cientista político Juliano Domigues, contudo, as conseqüências da sub-representação são grandes. “Num sistema representativo, o candidato eleito têm o papel de representar os interesses e demandas daqueles que o elegeram. Na medida em que determinado grupo é sub-representado, isso vai se refletir em déficit de políticas públicas voltadas para essa parcela da população”, afirmou. “A mulher ainda está descobrindo seu papel e está sendo muito pressionada não só pelos homens como pelas próprias mulheres”, declarou a também cientista política Cristiane Alcântara.
Procurada pelo Diario, a única deputada federal de Pernambuco na Câmara, Luciana Santos (PCdoB), disse que a distância do público feminino da política reflete a cultura da sociedade, que ainda é machista. Ela lembra que, dos 513 deputados na Câmara, apenas 45 são mulheres, menos de 10% do total.
“O PCdoB, proporcionalmente, é o partido mais feminino na história da Câmara. Nós temos 15 deputados federais e seis são mulheres”, afirmou a parlamentar, que foi a primeira a se eleger prefeita num município importante da Região Metropolitana do Recife em 2000. Ela ficou no comando da Prefeitura de Olinda por oito anos e elegeu o sucessor, Renildo Calheiros (PCdoB).
Rota de fuga
Apesar dos números negativos em relação à candidatura de mulheres no estado, foi possível observar um aspecto nas eleições deste ano. Por não terem intimidade com os financiadores de campanha, muitas mulheres pernambucanas optaram por disputar em pequenos partidos. O mais procurado foi o PRP, que terá 18 candidatas a estadual e quatro a federal, e o PSL, com 13 estaduais e quatro federais.
Na avaliação de uma liderança política que pediu reserva, o risco da alta filiação aos pequenos partidos é o de candidaturas fantasmas, de mulheres que se registram para preencher a cota dos partidos, mas que não disputam. “É uma coisa que vai precisar ser observada”, declarou o fonte, no anomimato.
De qualquer forma, a dificuldade para se filiar a legendas maiores é visível, porque elas têm que concorrer com nomes já bastante conhecidos na política. Para se ter uma ideia, o PSB, de Paulo Câmara, registrou a candidatura de quatro lideranças do sexo feminino para a disputa federal e 10 para estadual. Já o PTB, demarcou terreno com três candidaturas na Câmara dos Deputados e 10 no estadual.
Na disputa para a Câmara dos Deputados, 170 nomes foram escritos pelos partidos de Pernambuco, sendo 51 mulheres. Para a Assembleia, há 537 postulantes, de acordo com dados do TSE, sendo 159 mulheres desse universo.
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